quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Piano Para Pequena Clara – Dia 132


8 de outubro de 2014

23:38

Faz dias que não escrevo. Senti falta como uma viciada sem sua droga. Sem seu alívio. Sem sua paz. Sem seu conforto.

Sem seu lar.

Cris achou um livro sobre suicídio. Li uns trechos. Me deu vontade de escrever sobre isso. Se eu sair viva daqui, se sair daqui algum dia – e para onde iria? –, talvez conte uma história assim. Tipo alguém que tenta salvar suicidas, como um negociador. Mas, sei lá, vai ter uma pessoa que ele ou ela não vai ter conseguido salvar, e a pessoa se mata, talvez por negligência sua. E ele ou ela assume isso como uma missão: apagar um incêndio que talvez não possa ser apagado. Ou mesmo que possa, sempre haverá a possibilidade do incêndio voltar a queimar. Um negociador. Podia ser.

Até podia dedicar a história “àqueles que se foram cedo demais”.

Na verdade, comentei isso com Sarah. E ela me perguntou por que eu queria escrever sobre isso. Porque me chamou a atenção, respondi. É por causa da Cris, ela perguntou. Sim e não, respondi.

Cris já tentou se matar.

Você não pode salvar ninguém, disse ela.

Maldita. Talvez eu possa.

Suspiro.

Talvez não.

Mas se salvar a mim e fazer alguma coisa com a minha dor, que talvez seja o que tenho tentado fazer desde o primeiro dia em que comecei a escrever esta merda de história – esta merda de história que me faz ficar viva e me mata ou queima, mas por algum motivo me dá esperança a cada noite – já vai ter servido para alguma coisa.

Então você me pergunta: Clara está viva?

Ó, meu deus. Ela tentou se matar.

E não foi só uma vez.

Ela conseguiu? Ainda não sei.

Mas temo a cada noite e cada vez que me aproximo do abismo penso: talvez ela tenha conseguido e talvez tenha levado mais gente com ela.

Deus, se você existe, se existe algo aí, por favor: permita que este não seja o fim da história de Clara. Tenho vontade de chorar, uma vez mais. Por Clara.

Por Maria, a mãe.

Por você e eu. Neste quarto pensando naqueles que se foram, e naqueles que não quero que se vão. Não sei muito falar sobre isso. Mas sei que existe algo que se foi. E algo que não quero que se vá. Hoje não. Ainda posso mudar as coisas. Ainda posso mudar o que não aconteceu. Talvez o futuro. O pesadelo dos pesadelos. Talvez ainda possa, quem sabe, mudar o destino. Ainda não aconteceu. Talvez nem todos morram no fim. Talvez ainda dê para mudar. Talvez a vida grite dentro desta outra vida que insiste em ir embora, e a vida chama a vida, dizendo: fique mais um pouco.

Fique mais um pouco, garotinha.

Fique mais um pouco.

Amanhã você pode mudar de ideia.

E eu vou estar aqui. Estaremos e talvez possamos passear pelos jardins. E não será o jardim celestial, ainda não. Ainda não. Vou estar aqui, pequena Clara. Vou estar aqui te esperando.

Vou estar aqui te esperando, minha princesa linda.

23:57

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