sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Nanowrimo - Dia 29


23:18

Hoje já jantei.

Sim, eu também preciso comer, nem só de escritos vive a literatura.

Aos poucos vou contando o que existe aqui, além disso que escrevo. As pessoas do outro lado da porta, aquelas que se vestem sempre muito parecidas. Aos poucos vou contando aquilo que não quero contar, aquilo que não consigo lembrar. Aquilo para onde me recuso a olhar.

Outro dia falo sobre o acidente que me trouxe para cá.

Até onde eu lembro, claro, e não lembro de muito.

Por isso – você sabe – escrevo.

Sonhei com o homem moreno, magro e alto cujo nome, por algum motivo que ainda não sei, não consigo lembrar, ou não consigo criar, pois ainda penso que ele é fruto da minha imaginação, que estou todo esse tempo apenas tentando inventar uma historinha. De onde vêm as ideias, é o que sempre perguntam, não para mim, claro, mas para um escritor de verdade. Se ele for realmente um escritor sério vai dizer a única resposta realmente honesta que ele pode dar: não sei. Assim como não sei de onde tirei Clara, Maria e Lara, embora Sarah insista nessa história de inconsciente e que tudo aquilo que crio deve ter um pezinho em uma realidade distante, algo que não consigo mais pegar, mas escrevendo e escrevendo talvez descubra alguma coisa.

Continuo sem ter a menor ideia do que vou escrever segundos antes de sentar aqui. E não apenas esqueci da noite anterior; também esqueci como vim parar aqui – aqui nesta sala eu sei, mas me refiro ao antes.

Antes do acidente.

Meus braços cansam de novo. Começo a suspeitar que vou definitivamente falar para o vento, escrever para ninguém ler, embora ainda alimente a esperança infantil de que o príncipe venha salvar a princesa presa no alto da torre.

Infantil, eu disse?

Tem alguma coisa a ver com o passado.

Clara sabe a resposta.

Preciso encontrar essa garotinha.

Preciso encontrar ela antes que o homem moreno a encontre.

Eu sonhei que ele estava passando pelo corredor. Estava com uma cara de cansado. E acima de tudo, ele estava com uma cara de mau.

Como o Bicho Papão.

Como o Lobo Mau.

Mau, porque ia fazer mal para uma criança.

De novo.

Preciso encontrar Clara.

Preciso encontrar essa garotinha, esse anjo cuja inocência escorreu pelo ralo do chuveiro.

Meu deus, água junto com sêmen.

Preciso encontrar Clara.

Antes que seja tarde.

23:33

Nenhum comentário:

Postar um comentário