quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Depois do Nanowrimo – Dia 53


22:08
Estive lendo hoje e, claro, cada vez que leio outros autores acho o meu texto cada vez mais pobrinho. Meu consolo é que ninguém jamais vai ler isto que escrevo agora. Sarah disse: escreva o que quiser, o papel não vai te julgar, ninguém vai ler. E ninguém vai mesmo, nem eu, que jamais volto ao que escrevi na noite anterior, porque não quero lembrar.
Quer dizer, quero e não quero.
Mas você me pergunta se nunca saio do quarto. Digamos que este lugar onde estou, que pode também ser uma cela, seja um quarto. Bem, é claro que saio daqui. Não como aqui, e de novo estou com fome. Mas Sarah me pergunta se escrevi hoje, e tenho medo de que ela não me deixe comer se eu não escrever. Sei lá, depois de um tempo, eu mesma acabo me cobrando se não escrevi e mesmo que saiba que jamais vou ser uma escritora, eu, Maria Anônima, por algum motivo, depois que começo a escrever acaba saindo alguma coisa.
Uma coisa que ainda não entendi é por que o homem moreno de cabelos lisos voltou a beber depois de dez anos. Ouvi dizer que se alguém para de ir nas reuniões, mais cedo ou mais tarde volta a beber. Será que foi isso? Diga você, você me diria, a história é sua.
Sim, a história é minha.
E acredite, um arrepio me passa sorrateiro ao escrever isso.

Bom, eu posso escrever o que quiser, e se ficar ruim, ou muito ruim, é só voltar, escrever de novo. Para que se importar? Ninguém vai ler.


Mas fica a pergunta: ele já fazia o que fazia com Clara antes de voltar a beber? Acredito que sim, porque também ouvi dizer que o álcool apenas tira certos freios, mas não pode alterar uma índole. Talvez possa, não sei muito disso, ou sei, mas não sei, entende? Até porque eu não bebo. E acabo de me lembrar, pelo pouco que lembro da história que eu mesma criei, que um dos cheiros mais característicos da infância de Clara era o álcool. A casa, as paredes, o ar, a água do chuveiro. Tudo parecia vir de um sonho, e tudo tinha cheiro de álcool. Clara jurou que nunca ia beber, não sei se Jonas fez o mesmo juramento. Maria não bebia. E Lara?
Sim, ela bebia. Acabo de pensar que talvez, porque não seria de se espantar se tivesse sido assim, Lara tivesse tirado a blusa na frente do homem moreno de cabelos lisos e mostrado seus grandes seios, maiores do que os de sua irmã, maiores e mais rígidos, até porque ela era mais nova, ela era mais magra, talvez fosse mais bonita, e tivesse derramado cerveja sobre eles dois, e os dois, os outros dois, que estavam trancados no quarto, enquanto Clara e Jonas dormiam, e talvez – pensei agora – Maria estivesse no hospital, e talvez ela fosse para o hospital de tempos em tempos, era uma mulher doente, se esbaldaram, perdidos entre as montanhas que eram aqueles seios com cerveja e o abismo que eram aqueles seios com o veneno que, talvez, nenhum dos dois tivesse previsto que abriria a porteira para uma boiada que não poderia ser freada.
Estou com fome. Acho que vou comer agora. Eu tenho uma amiga que às vezes janta comigo. Gosto dela. Ela também é uma pessoa especial. Também porque existem outras pessoas especiais. Mas já me alonguei demais por hoje. Estou com fome e não consigo pensar quando estou com fome. Sei que você deve ter se perguntado sobre qual a relação que tenho e como é esta amiga, mas outra hora falo dela.
22:40

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