domingo, 6 de abril de 2014

Piano Para Pequena Clara – Dia 87

21:33

Cris vai jantar comigo hoje. Estou com fome, mas vou esperar ela, que foi tomar banho. Tem gente que toma banho junto aqui, e uma vez tomei banho e Cris ficou me olhando, deve ter me achad0 bonita.

Não quero falar disso.

Não quero falar de sexo.

Vi faz pouco no telejornal uma reportagem sobre uma tal de Sabrina, que esqueceu, de um dia para o outro, tudo o que aconteceu de 2002 até 2013. Ela não lembrava de nada, e a reportagem dizia que isso era porque ela tinha sofrido traumas, inclusive tinha passado por abuso, e tinha problemas com os quais nunca quis lidar, sempre deixou para depois.

Sei o que você pensou.

Mas não foi isso que aconteceu comigo.

Não mesmo.

Sarah vai pirar, e é por isso que nem ela nem ninguém jamais vai ler isto aqui.
A reportagem dizia que essa Sabrina começou a lembrar de algumas pessoas pelo seu cheiro.

Será que consigo lembrar de alguém por sons?

Quem sabe um piano?

Cris saiu do banho. Perguntei se “quase” pra ela, e ela disse “hum-hum”.

Sei que quando vi a reportagem dessa mulher, pensei na história que estou tentando criar. Não que tenha alguma coisa a ver com a outra. Porque, repito, não foi isso que aconteceu...

Comigo?

Paro de escrever. Penso em Clara. Penso em Maria. E acho que não precisaria de mais ninguém para esta história. Cada vez que vejo alguma criança, e vejo de vez em quando, penso em Clara. Todas as crianças que vejo são Clara, sorrindo, cheias de vida, e com a estrada inteira para serem o que quiserem. Todas cuidadas por Maria, a mãe.

Paro de escrever de novo. Virando a esquina, crescendo no horizonte, uma vontade de chorar. Todos choram, todas choram. Esta história podia ter apenas Clara e Maria. Mas aquele maldito médico de reputação intocável tinha que vir para estragar tudo.

Mas talvez, no fim, ele não tenha conseguido acabar com tudo. Diz a reportagem que a Sabrina acabou lembrando de tudo. Só não disseram qual foi o trauma que ela não quis lidar. Que deixou para depois e foi engolida.

Eu também ainda não sei a chave para o fim da história de Clara. Mas vou continuar escrevendo. Talvez o feitiço apareça de novo.

E talvez, e espero isso em segredo quando vou dormir, aquele maldito homem não tenha acabado com tudo.

21:41

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