terça-feira, 1 de abril de 2014

Piano Para Pequena Clara (Nanocamp)

(Nota: durante abril, está acontecendo o Nanocamp, que é uma versão mais light do National Novel Writing Month - Nanowrimo -, então os escritos das próximas quatro semanas serão do Nanocamp e para isso "comecei uma nova história" - ou nem tanto. É a continuação do Piano Para Pequena Clara, agora no dia 83.)




Meia-noite.

Vamos começar uma nova história. A partir do nada, assim como foi no começo. E esta começa à meia-noite. E a madrugada começa, e vamos juntos, tateando a narrativa mais uma vez. Escrevendo e tirando as palavras não sei de onde.

Apenas escreva, disse Sarah.

A quem estou enganando? Não posso começar uma história se nem terminei a outra. Ou talvez isso que tento agora, tão sem jeito – sempre sem jeito, Maria Sem Jeito – pode ser um novo começo.

Eu realmente queria começar tudo de novo. Jogar no lixo todas as bobagens que escrevi.

E fingir que não aconteceu.

Que foi apenas um sonho ruim.

E talvez tenha sido isso mesmo.

Meus braços doem, mas vou me forçar a escrever mais um pouco. Talvez escreva esta nova agora, e jogue no lixo a outra. Ou poderia ser, sem que ninguém soubesse, a continuação daquilo que não terminou. Porque a verdade é que esta merda não terminou. E não vai terminar antes que dê um fim nisso.

Fácil falar.

Todos morrem no fim. Fim.

Mas não sei se todos morrem no fim. E se morrem, como morrem? E se morrem, morrem todos mesmo? Eu não sei. Por isso escrevo.

A porta está aberta. Silêncio no corredor vazio. Sinto aquela dorzinha interna soprando um fio de melancolia em meu peito, mas pode ser apenas o começo de um novo mês. Nem sei há quanto tempo estou aqui, e também não importa que dia é hoje. Que noite é hoje. Mas por algum motivo sei que um novo mês está começando agora. Meus braços continuam doendo.

Então vi a foto de Maria, a mãe, e a pequena Clara, deitada sobre suas costas, as duas sorrindo sobre um tapete verde de grama. Sim, a foto que ficava em cima do piano de Maria. Mas vi essa foto jogada no chão. Quem sabe em uma parada de ônibus. Como ela foi parar lá? Como elas foram parar lá?

Fugindo de Claudius, o maldito homem alto e moreno de cabelos lisos?

Queria tanto que elas tivessem fugido. Ou que tenham fugido. Ainda há esperança. Um novo mês começa. Talvez não morram todos no fim. Talvez não morram. Talvez. Não.

Não sei mais o que escrever, como jamais sei o que vai acontecer nesta história doida que tento criar, sei lá de onde. Vá lá, já sei que tem algo de mim, tudo é autobiográfico em maior ou menor grau, não é mesmo? A vontade de chorar me abana, me convida para uma dança. Recuso. Hoje não. Estou cansada. Talvez tente dormir. Sei que não vou conseguir, mas alguma coisa tenho que fazer.

Penso em Cris neste momento. Ela não está aqui, e sinto como se ela estivesse bem longe neste momento. Queria poder ouvir o som do piano. Mas talvez não haja mais tempo.

Essas coisas que escrevo, diz você, estão cada vez mais confusas.

Ou talvez você seja a única pessoa a entender o que estou tentando... esconder? Se você sabe, por que me tortura? Se o fim disso tudo é uma tragédia, por que não me poupa e conta logo o que está no fim disso tudo? Talvez porque eu esteja viva, e preciso contar a minha história.

Quero dizer, preciso contar, ou criar, esta história de merda.

Preciso descobrir.

Preciso saber como ela termina. E sei quase nada dela. Mas sei que ela não termina hoje. E isso basta.

Por hoje.

00:18

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