domingo, 9 de março de 2014

Depois do Nanowrimo - Dia 75

22:23

Para você que me lê e não sei o que você pensa, meu leitor anônimo – ou leitora, não importa. Você que me diz para continuar escrevendo e esquecer o resto. Você que, suspeito, vem me visitar depois que adormeço. Você que de alguma forma me empurra a querer aguentar mais um dia. Para você escrevo hoje. Este alguém-ninguém, o interlocutor para o qual me dirijo todas as noites, e pode ser apenas a voz em minha cabeça, e não tenho como saber se essa voz está dentro ou fora, e honestamente, não interessa.

Maria Que Houve Vozes.

Hoje li um texto que falava sobre jovens que se mutilavam, e no prazer que eles sentiam com isso, meio como se fosse uma droga, o prazer de sangrar, de ver a vida escorrendo aos poucos. Talvez a falta de coragem de cortar tudo de uma vez – ou falta de habilidade, já que a maioria das pessoas que se cortam não entende de anatomia, e se soubesse, e entendesse como o corte deve ser feito (e não vou registrar aqui porque não quero que alguém se mate por minha causa; por favor, mais uma, não), muita gente estaria morta a essa hora.

Jantei com Cris hoje – reparou que não mencionei a fome hoje? Fiquei feliz de ver que ela está bem. Acho que fiquei com saudades, embora não lide bem nem com esse nem com outros sentimentos. De qualquer forma, ela me deu um abraço e um beijo. Não sei como me senti em relação a isso.

Mas lá no fundo eu gostei.

E então paro de escrever e olho para meus próprios braços e algumas cicatrizes.

Me ocorre neste momento, e sei lá de onde tirei isso, ou sei e preferia não saber de onde veio a inspiração, que Clara também se cortava escondido. Ela fazia pequenos cortes com a gilete em seu braço. Não sei se ela sentia prazer ou como ela administrava isso, mas sei que ela queria morrer. Quer dizer, queria, mas talvez não quisesse.

O homem moreno e alto de cabelos negros e lisos que arrepia você cada vez que surge nesta história, talvez não tenha reparado nisso. Ou se reparou, não deu bola. É claro, quando ele tomava banho com ela, tinha coisa mais importante para notar no corpo dela do que cortes em seus braços.

Poderia dizer que bem poderia haver um corte em seu pescoço nesta história, mas estou ficando com sono. Efeito dos remédios, você me pergunta. Não sei, estou sempre alguma coisa, um pouco para baixo, um pouco mais para baixo e, às vezes, um pouco para cima. Mas pensei que gostaria de poder escrever esta história em um horário em que eu não estivesse muito cansada, ou muito triste, ou morrendo de fome.

Provavelmente isso não vai ser possível, até porque não foi possível até agora. Vou me virando como posso. O mundo ideal parece que não faz parte deste lugar e, como você já deve ter notado, não estou em uma colônia de férias. Às vezes penso nesta história, muito de vez em quando, antes de chegar a noite e eu recomeçar a escrever. Penso, esqueço, penso de novo, esqueço de novo. Então, para que me preocupar?

A história vai seguindo em frente, embora eu ache que ela não vai a lugar nenhum. Não importa. Vou jogar tudo fora assim que terminar, e ninguém vai ter lido. Clara vai sumir sem deixar vestígios.

Mas ela já sumiu sem deixar vestígios.

Pelo menos até onde eu saiba.

Preciso descobrir como termina esta história.

E espero não morrer antes que isso aconteça.

22:53

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