terça-feira, 15 de março de 2016

Piano Para Pequena Clara – Dia 195


Terça-feira, 15 de março de 2016

A porta está fechada. A dor volta. Ela tem voltado porque parei de escrever esta merda – quase um mês que não escrevo. Esta história me adoece, mas adoeço ainda mais quando não escrevo. Maria Que Precisa Seguir Em Frente. A Garota Bossy, a Rainha Que É Tão Frágil Que Um Vento Poderia Partir Ela Ao Meio me parou no corredor outro dia e ordenou: escreva. A Garota Cheshire, o sorriso da loucura, perguntou por que não tenho escrito. Não tenho nada para escrever, como nunca tive, desde a primeira frase que escrevi neste pesadelo.

Mas o pesadelo tem que acabar.

Estaremos perto do fim?

De descobrir como afinal termina a história da pequena Clara, Maria, a mãe, tocando para sua garotinha, Dr. Abusador Claudius, Titia Putinha Lara, Marcos, Jonas. Quem mais? Acho que esse é o núcleo daquela família.

Mas aqui há a ala das Garotas Que Voam Pelos Muros. Não sei por que escrevo isso, se estava pensando em Clara. Talvez porque descobri que por aqui há mais lugares que eu não conhecia. Não conheço a história de Clara, não conheço os confins deste asilo. Há outras alas, gradeadas, para gente mais perigosa, acho que aquela presidiária que chamava Cris de Monique veio de lá. Não sei bem o que escrever, mas sei que há outras alas por aqui, e não sei como falar disso. Não sei descrever, mas este lugar é maior do que eu pensava.

Bem maior.

As Alas Gradeadas, na falta de um nome melhor.

Garotas Que Mataram.

Garotos, talvez.

Essa história começa a se afunilar. Talvez a loucura que conheci seja apenas uma pontinha do mais que há aqui. Talvez a loucura mansa que conheci tenha sido levada até o lugar onde as grades afastam as loucas perigosas das loucas mansas. Poderia ser uma Ala das Garotas Perigosas. Mas talvez não sejam mesmo perigosas. Sarah me mostrou um texto em que conta a história de como um tal de Pinel associou a loucura com periculosidade, porque na Antiguidade ser louco não era ser perigoso; depois veio o ser louco é ser mau, ser do diabo, e todo aquele papo de tocarem fogo nas pessoas para acabarem o mal.

De novo, o incêndio me volta a mente. O incêndio que talvez seja o fim da família de Clara. Claudius bem que poderia ter morrido carbonizado. Mas não sei como isso aconteceu, se é que aconteceu. Ou não sei como vou conduzir esta história a um fim desses, Maria, péssima escritora.

O que as garotas fizeram para irem para a Ala das Grades, dos corredores pintados com poesias, loucura tatuada nas paredes, como já ouvi falar?

Mataram as mães?

Ó, meu deus, mataram as mães?

Mereceria eu ir para uma ala dessas?

Será que eu matei a minha?

Queria chorar, mas não consigo. Estou paralisada, o ar entra e sai com dificuldade, a dor vai e volta, arranhando, sangrando, e hoje não há como cicatrizar, não há como parar, puta que pariu.

Será que todo esse tempo... foi assim que vim parar aqui?

23:30

Nenhum comentário:

Postar um comentário