#ProjetoBorboleta
26
de julho de 2016
21:04
Ontem
foi Dia do Escritor. Nem lembrava, foi Cris quem me avisou e deu os parabéns.
Tinha pensado em escrever ontem, como sempre sem ter a menor ideia do que ia
escrever, como ainda não tenho, mas decidi dormir. O caso é que hoje choveu e
venta lá fora. Não sei se foi isso, ou o fato de eu ter caminhado aqui pelo
pátio e reparado que as Garotas da Fita Preta e as Garotas Com Borboletas não
são tão poucas assim. Acho que depois que entendi o que significam seus sinais
comecei a prestar mais atenção nelas.
Acho
que todas fazemos parte da imensa Irmandade das Meninas Com Fendas, algumas
frequentadoras da ala das Meninas Que Se Cortam, outras – às vezes as mesmas –
frequentadoras da ala das Meninas Que Voam Pelos Muros.
Somos
anjos, entendi outro dia.
Querendo
voltar para casa.
A
fita preta e a borboleta são nossas etiquetas de sobreviventes. Sinal de que a
vida não tem sido tão colorida assim. Mas sinal também de que somos, afinal,
corajosas. Pelo menos por hoje: estamos vivas. E eu, Maria, sei lá por que,
quando escrevo estas palavras mal escritas que jamais serão lidas, em meu
quarto-cela, talvez alimente a cada vez que me fecho aqui a possibilidade de
levar um pouco de cor para elas nesta vida tão preto-e-branco. Mas vá lá,
preto-e-branco também tem seu charme. Podemos encontrar um sentido, mesmo que a
vida seja preto-e-branco por muito, muito tempo. Podemos, sim. Por que não?
Pelo
menos hoje: não voamos pelos muros.
A
borboleta de Cris, que eu saiba, já se apagou. Mas pelo menos ela não quis mais
voar pelos muros. Das outras, tenho visto pouco. Estariam de férias? Férias do
quê? Da vida? Acho que todas nós temos um tipo de loucura que nos faz únicas.
Especiais, eu diria, porque hoje choveu e está frio, e isso me anima.
Mas
nem todas querem voar pelos muros. Nem todas carregam lâminas escondidas, nem
todas usam fita preta ou desenham borboletas, em si ou em cadernos, nas
paredes.
Acho
que essas que fazem isso, de alguma forma, são as mais especiais.
Então
me pergunto, porque tudo deságua nela: algum dia a pequena Clara, se é que
cresceu, usou uma fita preta?
Algum
dia, Maria, a mãe, desenhou uma borboleta em si?
Tenho
vontade de chorar quando escrevo esses nomes, porque tudo o que faço aqui é
fugir deles, me esconder de mim mesma sem ser encontrada. Mas eles me chamam. Tipo
vozes, que poderiam dizer – como talvez já tenham dito, uma vez Cris disse que
já ouviu vozes dizendo isso – se mate. Morra.
Talvez
as vozes que ouço hoje digam apenas: escreva sobre nós, Maria. Escreva sobre suas
irmãs, suas filhas. Escreva sobre nós, Maria. E faremos uma borboleta com seu
nome, uma borboleta linda chamada Maria, e hoje não nos cortaremos, Maria, hoje
não voaremos pelos muros.
Tenho
vontade de chorar, mas também suspiro, com um quase sorriso de alívio de missão
cumprida. Estamos aqui por um motivo, meninas. Vou continuar escrevendo,
garotas lindas.
E
quero uma borboleta com meu nome.
21:24
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