17 de agosto de 2014
14:16
Já tinha – de novo – oficialmente desistido de escrever este
livro horrível que ninguém jamais vai ler e só não joguei tudo fora ainda porque...
Não sei bem o porquê. Sarah deve ter suas teorias psicanalíticas, tipo: Maria
que não quer escrever, mas quer escrever, porque tem medo e sabe que vai acabar
descobrindo o que finge não ver, por isso desiste o tempo todo; Maria Desiste,
mas Maria Insiste”.
Que droga, me perdi em meu raciocínio. Acontece que faz dias
que não escrevo, como você que me lê quando não estou por perto, mesmo que você
seja apenas uma invenção de minha mente confusa, já deva ter notado. Sarah me
sugeriu escrever, se possível, todos os dias. Escrever o quê, se não tenho nada
para contar?
− Todos temos, disse ela.
Era só para eu inventar uma história e nem isso consegui
fazer. E então surgiram Maria, a mãe. Claudius, o pai. Não sei se foi sonho ou
delírio, mas vi Claudius. Com seu olhar profundo, como cavernas escuras que a
gente entra com medo e desconfia que existe um monstro a nossa espera. Até
porque existe mesmo. Dr. Monstro A Sua Espera. E depois vieram a pequena Clara,
que imagino ser o centro de tudo. Ou também A Sua Espera.
A Espera De Maria.
Ainda não entendi a mágica que acontece quando começo a
escrever sem nunca – nunca mesmo – saber o que virá a seguir, e parece que as
palavras surgem. Sarah diria algo como associação livre. Oh, psicanalistas. Mas
acho que as palavras, pensei agora, estão surgindo desta caverna, que também
surgiu do nada. Ou, vá lá, talvez das profundezas do meu inconsciente.
O caso é que hoje estava lendo uns trechos de entrevistas
daquela Clarice, em que ela era a entrevistadora, e li que alguém chamada
Nelida Piñon tinha horror à palavra inspiração, e acreditava piamente na
disciplina, em escrever mesmo cansada, doente, sem nada. Como também ando
cansada e nos últimos dias fiquei mal do estômago, com tonturas e disposição
zero e negativos, achei que fosse um chamado para eu voltar a contar esta busca
pelo mistério de Clara. Também ouvi de um desses caras daqui, um garoto quase
homem, pequeno gênio, careca e de óculos, discursando sobre Aristóteles na
quarta passada. Ele disse que temos que fazer o que a gente nasceu para fazer,
que temos que seguir a nossa natureza, sem se importar com os resultados que virão.
Gostei desse Aristóteles. Não sei se o grego ou o que deu esse discurso.
Sei o que você pensou agora, mas vou me abster de comentar.
Gostei do Aristóteles, e daí?
Pensei que às vezes ser louco – ou louca, no meu caso – tem suas
vantagens. Não temos nada a perder. Podemos ser quem nós somos, seja lá o que
signifique isso.
Cris me disse que minha história está muito longa.
Vou escrever isso, falei.
Isso o quê? perguntou ela.
Nada, respondi.
Almoçamos juntas hoje. Acho que ela está melhorando, aos
poucos.
Um dia de cada vez.
De onde tirei essa expressão? De novo me vem à ideia de
Claudius indo naquelas reuniões até o dia em que decidiu tomar um champanhe
escorrido entre os peitos de Lara. Mas antes disso, voltando ao meu pensamento
inicial, eu disse que tinha visto Claudius. E ele estava segurando Clara no
colo. Não como um namorado, não como um animal. Com carinho.
Com carinho de pai.
Realmente há mais nesta história do que consigo supor.
E é por isso que vou voltar a escrever e chegar mais perto
daquele abismo do qual tenho medo.
Um dia de cada vez.
14:41
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