Quarta-feira,
15 de abril de 2015
22:46
Cheshire,
que está de aniversário amanhã, a garota que é toda ela sorriso, o sorriso da
loucura, o sorriso que às vezes me faz acreditar que não há nada de tão errado em
estarmos todas aqui, me levou ontem para ver os corredores. Os corredores
longos e suas paredes deste lugar, as janelas, as cores. Nunca tinha reparado
muito neles, talvez por já ter me acostumado.
A
gente se acostuma com a loucura até que ela se torne normal e louco se torna o
que está de fora disso tudo.
Já
tinha me programado para escrever esta história que nunca dá em nada quando
Cheshire me levou para ver os corredores. Pode ter sido coincidência.
Enquanto
escrevo, chove.
Chove,
escrevo. A história que talvez termine em um dia de chuva. Talvez uma noite,
não sei. Talvez ela recomece em um dia de chuva. Escrevo, tateio a narrativa,
tento encontrar uma luz na dor que me fez esquecer. Dor tão doída que tive de
apagar, e aqui estamos nós.
Teoria
do trauma. Sarah e suas paranoias.
O
caso é que mostrei os corredores para Lady Ballet também. Ela me disse que
nunca tinha reparado neles, que imaginava esses corredores pintados de rosa, e
pensei na hora que ela já deve ter sido rosa. Talvez seja até hoje, ou tente
ser. Quando não coloca as coisas para fora, Lady Ballet é rosa.
Cheshire
é azul.
Acácia
e Blossom, não sei.
Estou
cansada. Corro tanto e acabo morrendo no mesmo penhasco: Maria, a mãe e sua
pequena Clara. A criança mais linda do mundo, filha da mãe mais linda do mundo.
Maria.
Maria,
como eu.
Suspiro.
Tem
muita coisa acontecendo, dentro e fora de mim, e não consigo falar disso, puta
merda. Mas Sarah disse para eu continuar escrevendo. Nem preciso – e não vou –
mostrar para ninguém. Assim posso escrever o que quiser.
Ninguém
vai ler esta merda.
Cheshire
deve estar em algum arroubo de loucura enquanto escrevo, talvez comemorando seu
aniversário no meio de gente igualmente doida. Lady Brownie também está de
aniver por estes dias. Vou apenas escrevendo, sem pensar, tudo aquilo que me
vem à mente, em tempo real. Escrever é pensar em voz alta, ou pensar em voz
alta com palavras que me fazem parar o tempo. E talvez voltar e encontrar um
sentido para a dor que me fez esquecer. A mesma que me faz continuar
escrevendo.
A
dor que cura.
A
dor que me afasta daquele médico filho da puta, Sr. Todo-poderoso, Estuprador
De Filha, Claudius. Quanto mais tento não pensar nele, esse personagem maldito
que meu inconsciente fabricou se solta das florestas escuras de minha mente e vem
para assombrar. A mim, a Maria, a mãe, a pequena Clara. Talvez Jonas e Marcos,
de quem pouco falo.
-
Por que nesta história não tem personagens homens, me perguntou Cris.
Fiquei
pensando numa resposta.
Sarah
certamente tem uma teoria psicanalítica sobre isso.
Tudo
é papai e mamãe, não é mesmo?
Mas
há Claudius. Claudius é homem, e foi homem quando deveria ter sido pai, maldito
seja.
E
então há Marcos e Jonas. Houve um ou outro homem espalhado nesta narrativa, da
qual pouco recordo. Marcos e Jonas, lembro: irmãos de Clara.
Por
que nunca falo sobre eles?
Jonas,
filho de Maria e Claudius, é irmão de Clara.
Marcos,
filho de Lara – titia vagabunda que fez o papai voltar a beber depois de dez
anos em uma festa de réveillon – e de Claudius, que deveria ter cuidado de
Maria no hospital e não estar em casa se divertindo com a cunhadinha. Mas
Marcos talvez, pensei agora, tenha defendido sua meia-irmã Clara de Claudius. E
talvez já tenha escrito isso aqui, não lembro.
De
Jonas, sei pouco. Maria Péssima Escritora.
Mas
Marcos defendeu Clara.
Ele
enfrentou Claudius.
Talvez
ele tenha mudado esta história, no fim das contas.
E
esta história horrível, que sempre penso terminar em um dia de chuva e em morte
de um, ou de todos, talvez possa ter encontrado uma pontinha de esperança,
pouco antes do abismo.
Um
pouco de esperança, pequena Clara.
E
para mim, hoje basta.
23:11
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