sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Piano Para Pequena Clara – Dia 178


6 de agosto de 2015

23:30

Uma madrugada está para começar e sou a rainha disto aqui. Cheshire estava comigo conversando em volta do chafariz que ela adora, que às vezes acho que é o segredo de seu sorriso, da garota que é mais sorriso do que garota, e perguntou se eu estava escrevendo, se tinha escrito na chuva que fez esses dias. Eu disse que não.

− Ainda tem coisas que você precisa descobrir.

Me arrepiei quando ela disse isso.

Não tive coragem de perguntar “como assim?”.

Será que Cheshire sabe da verdade?

Será que Lady Ballet, que anda correndo por aqui para ficar bonita para o seu maluquinho, sabe?

E Acácia, a doce garota que se perdeu em algum lugar dentro de si mesma?

E Dafne, que me disse que descobriu cores novas, ela também enamorada por outro desses malucos daqui?

Lady Brownie, a garota que vive em slow motion, a rainha dos doces, a garota que queria esquecer, assim como eu queria, e talvez no fundo não queira mesmo, lembrar?

O Garoto Skinner que também acha que loucos se entendem, se amam, se completam? Ele com suas teorias loucas de que não importa o que a gente sente ou pensa, apenas o que faz, e será que Blossom, a garota que também escreve escondidinho, Sabby que vejo pelos corredores de vez em quando ambas estamos na mesma realidade – o que não é, convenhamos, muito frequente.

Cris, querida Cris.

Será que elas sabem?

Acho que todas têm suas teorias.

Sobre a Mitologia de Maria.

A Chica Tortoni, a Srta. Vygotsky que, disseram, saiu do asilo. O que elas sabem?

Sei que Sarah disse que vai voltar a ministrar umas aulas para quem quiser. Tipo assim, para entendermos melhor nossa loucura. E fazermos as pazes com ela.

Delírios, diria Cheshire.

Lady Ballet, não, Lady Brownie, lembrei agora, disse que queria dançar uma valsa.

Acho que há mais de um jeito de dançarmos essa valsa.

As garotas que pararam de dançar me convidam.

Assim como, neste momento, porque tudo é sobre ela, eu queria dançar com Clara. A princesinha, a joia rara, a joia do papai. Não, do papai, não. Parece que no próximo domingo é dia dos pais. Ela não era a joia do papai porque o papai era um filho da puta e espero que ele esteja queimando no inferno, maldito Doutor Abusador.

A joia da mamãe.

Por mais que ainda doa, e que eu não tenha jamais o que contar sobre esta história que nem história é, apenas um emaranhado de conexões dentro desta floresta escura que, acho, é meu inconsciente, no fim do parágrafo, no fim destas frases sem fim, ainda brota esperança.

Sim, Cheshire, ainda tem coisas que preciso descobrir.

Respiro, cansada. O calor volta aos poucos. Queria chuva, mas não posso esperar por ela. Nem Clara. Nem Maria, a mãe. Não podemos esperar pela chuva. Mas sei que ela virá. E nos limpará a todas. Enxaguará nossas cicatrizes levando este passado do qual não lembro, mas que dói até hoje, a fenda que é a fenda de todas nós, embora.

Para longe.

Lá onde brota a esperança.

No fim da frase.

No fim de tudo.

23:50

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