16 de julho de 2014
23:33
Você me pergunta se ando estudando, se leio esses artigos
para pesquisar. Se isso que conto daqui é um diário e fico me enrolando em vez
de contar as coisas de lá, da história de Clara, que é o que deveria
interessar, não a minha história. Mas acredito que, de uma forma que ainda não
posso entender – ou não quero entender, vá lá –, o que conto aqui e o que conto
lá está interligado. Sarah disse que era só para escrever, qualquer bobagem,
qualquer pensamento. Que nem Freud disse que era para fazer. Nada é trivial.
Esses psicanalistas do inferno.
Mas começo a pensar que eles têm razão.
E volto a pensar que esses textos, vídeos, reportagens e o
diabo, tudo faz parte de uma conspiração para que eu conte a história de Clara.
Acredite, e só escrevo isso porque sei que ninguém vai ler: a vida está me
deixando pistas, pegadas para eu seguir. Preciso escrever para saber como
termina a história de Clara, e como começa a minha. Acho que por isso falo um
pouco daqui. Observei Emília hoje. Ela é um personagem, definitivamente. Seus
cabelos estavam cor de ouro. Ela é toda tímida, fala algumas coisas sem sentido
(embora eu entenda tudo o que ela quer dizer) e fica vermelha. Quase roxa,
sobre sua pele muito branca. Não passeei no campo. Nem senti o cheiro do doce
de Lady Brownie. Nem vi o namorado-maluco de Jade. Nem ouvi a voz de Cris.
O que me restou foi vir para cá de novo e escrever. Mesmo
sem ter o que escrever. Apenas continuar escrevendo, até que alguma coisa
aconteça. Alguma reviravolta. Algo que faça você, que quem sabe me lê, ter medo
de dormir de noite. Mas não sei se consigo fazer isso. Eu não sei escrever.
Neste momento volto a pensar que um dia eu soube contar histórias.
Ainda há coisas nesta história que não posso revelar.
Não desista tão cedo. Se você veio até aqui, pode ir um
pouco mais.
Jonas e Marcos, os garotinhos. Um irmão de Clara, o outro,
não assumido, também. Três filhos do Dr. Claudius. Dois de Maria, um de Lara.
Vejo em minha mente de pretensa criadora uma foto em
preto-e-branco. Lá está Maria, a mãe. E Lara, que era menor. Maria era bonita.
Posso ver a juventude e seus cabelos lisos e negros.
Lisos e negros como os meus, não posso deixar de registrar.
Talvez Maria tenha pintado os cabelos, como eu mesma acho
que pintei. Eles são negros agora. Não lembro como eram. Não lembro de nada.
Mas gostei de criar esta foto: Maria era uma mulher bonita. Talvez linda. E
Claudius, penso agora, se apaixonou por ela. Eles começaram a namorar, depois
noivaram. Casaram. Não consigo imaginar, mas... Bem, Maria devia estar linda em
seu vestido branco e amparada pelos santos de uma igreja grande, talvez a
Catedral Metropolitana. Claudius já era médico, casou em grande estilo. Eles
seriam uma família feliz.
E então viajaram em lua de mel. E Maria engravidou.
Agora fiquei na dúvida: quem veio antes, Clara ou Jonas?
Maria tocava piano. Talvez tocasse para Claudius. Talvez
tivesse tocado em seu casamento.
A cada palavra que escrevo, tenho medo de descobrir aquilo
que não estou preparada para ver. Ainda não.
Uma coisa que você já deve ter notado: eu chego na beira do
penhasco, e volto. Não tenho coragem de pular, mas a cada vez que volto, chego
mais perto. Começo a alimentar a ideia de fazer o que disse que não ia fazer:
reler esses escritos. Talvez essa historinha ficasse melhor escrita, eu mesmo
teria mais ideias.
Mas sei que não posso postergar para sempre: um dia vou ter
que me jogar daquele penhasco e esta história terá fim.
23:56
A história está melhorando, parabéns!
ResponderExcluirbjos
Alice
Thanx. Saudades de te ver por aqui.
ExcluirBjos, bjos!
Gilles Deleuze (1193) " Escrever é uma questão de devir, sempre inacabado, sempre a fazer-se, que extravasa toda a matéria vivível ou vivida." Por isso continue a nadar... Continue a escrever.. Beijos. Angélica
ExcluirSim, vou continuar nadando e escrevendo. Daqui a pouco tem capítulo novo. A propósito, a partir da citação do Deleuze, descobri este artigo, bem interessante:
Excluirhttp://www.revistas2.uepg.br/index.php/uniletras/article/viewFile/3988/3162