23 de julho
de 2014
23:17
Você me diz
para eu ficar na atividade, que tenho que continuar escrevendo. Que já está na
hora de chegarmos a algumas conclusões, algumas afirmativas em vez de apenas
hipóteses para a história de Clara. Mas a verdade é que não sei. Ou ainda não estou
pronta para saber, não quero saber.
Vou ter que
ficar neste quarto mais algum tempo.
Me preparo,
noite após noite, para um show único. Que ninguém vai ver. Mesmo assim, tenho
que estar aqui.
Acho que
Cris está namorando uma dessas gurias daqui. Quem será? Brownie? Emília? Jade,
que no fim das contas achei que estivesse com um desses caras daqui, e talvez
esteja escondendo o jogo? Não sei. Uma vez, nas raras coisas que ela fala,
Emília disse que também sentia atração por mulher. Quem sabe?
Lá fora,
chove. De novo. Como talvez seja o começo e o fim da história de Clara. Muitas das
noites em que vim aqui escrever estava chovendo, e isso não pode ser por acaso.
Talvez um
incêndio tenha matado a todos, e os pingos caíam em seus corpos carbonizados.
Talvez
sobre Maria, a mãe.
Talvez
sobre Clara.
Ó Deus,
permita que este não tenha sido o destino final dessas pessoas que tento ligar
nesta história sem pé nem cabeça, nesta história horrível que tento contar e
que faço de tudo para não ter que escrever mais. Só que preciso chegar ao fim
disso. Essas frases, que vou improvisando assim, feito um solo de piano, me
doem uma a uma, mas também, de alguma forma, cicatrizam – meus braços e suas
marcas, que não sei como foram parar ali. Como eu mesma não sei como vim parar
aqui.
Um solo de
piano.
Talvez
ainda exista esperança.
Ontem li
dois relatos de garotas que foram abusadas. Uma pelo ex-namorado, a outra pelo
chefe. As duas foram violentadas, espancadas, humilhadas, talvez cuspidas,
talvez tivessem dito a elas: não grite, na conte a ninguém. Ninguém vai
acreditar em você.
O mesmo que
disseram para Clara.
As duas
disseram que ficaram com nojo de homem, com nojo de sexo, com nojo da vida.
Sei lá
porque, mas acho que já pensei algo semelhante.
Sarah,
maldita, está conseguindo me levar para a beira deste penhasco. Sei que me
aproximo dele, mas não consigo parar. Há uma estranha força que parece me
conduzir quando escrevo, quase como se alguém ditasse tudo que devo colocar
aqui.
Maria
Marionete.
Não sei
onde vai parar isso tudo. Era apenas para eu inventar uma história. Foi assim
que tudo começou. Mas agora não consigo terminar. Nem parar.
Rumo ao
abismo. Esperando por aquele piano, para salvar nós duas. Talvez nós três.
Eu.
Maria, a mãe.
E Lady Clara.
Não vou
desistir de vocês. Espero que Claudius morra no fim disto tudo e que queime,
muito lentamente, sentindo cada segundo, no inferno, se existir algum. Lara,
não sei. Ela deveria ter cuidado da sobrinha Clara. Deveria ter cuidado do
filho Marcos. Mas estava ocupada demais sendo a princesa dos olhos de ouro para
o doutor. A putinha dos olhos de ouro.
Mas o piano
talvez toque para aquela garotinha linda, e mesmo que sua melodia fosse triste,
doída, sangrada, mesmo assim: talvez ela ainda traga um pouco de paz.
23:43
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