10 de outubro de 2014
22:45
Ainda dói. Dói como parece que não vai passar e escrever é
sangrar para cicatrizar alguns rasgos. Chorar para secar. Me arrepio e
entonteço. Devo seguir em frente neste texto que ninguém jamais ler. Algum dia,
se tiver coragem, coisa que não tenho, talvez releia alguns destes escritos.
Talvez organize estas páginas.
Para dar algum sentido à dor que não pode esperar.
A dor que me faz escrever.
Pensei em Marcos, o filho não assumido de Claudius com Lara.
Daqui a dois dias vai ser Dia da Criança. Grande merda. Infância é a última
coisa que quero pensar. Mas confesso que não lembro. Ainda não lembro. Não
lembro de passado. Nem de como vim parar
aqui. Mas o fato é que vim.
Quem sabe um suicídio que não deu certo.
Juro que não programo o que vou escrever, as palavras apenas
saltam e ainda não sei de onde elas vêm. Ou não quero ver porque dói lembrar.
Talvez esta história seja sobre a infância. Sobre abandono. Sobre um marido que
batia na esposa. Que abusava da filha. Abusava de todo mundo. Sarah me disse
que abuso emocional dói igual. Às vezes mais. Trauma psíquico dói como o trauma
real. Isso lembro de ter lido.
Queria criar uma cena onde as crianças brincassem. Sem
Claudius. Sem Lara. Sem dor. Apenas brincassem e para sempre seriam, e talvez nesta
história elas possam ser para sempre: crianças. Talvez a história de Clara seja
sobre isso. Marcos brincando com Clara e Jonas. Talvez Jonas e Marcos
brincassem brincadeiras de guris, porque brincadeiras de gurias eram outras
coisas, mas talvez ainda não houvesse homem ou mulher: apenas crianças. E não
deveria haver homem ou mulher, nem homem querendo mulher, homem querendo comer
mulher, tia que dá para o papai que bate na mamãe e quer brincar de médico com
a filhinha.
Que história horrível.
Mas talvez, não sei como, haja um toque de delicadeza no
meio deste inferno.
No meio da dor.
Ainda há esperança.
O calor está voltando, mas hoje choveu e esfriou um pouco.
Parece que a chuva me alimenta. O frio também. A chuva quer me dizer algo, como
lembro agora de que em algumas noites que vim aqui escrever estava chovendo.
Talvez exista uma chuva importante na história de Clara.
Uma chuva e um incêndio.
Uma chuva depois do incêndio.
Vejo uma cena cinza. Gosto de cinza. E há pingos de chuva nela.
Não sei se é um quadro ou uma fotografia. Pode ser preto e branco, mas imagino
que seja cinza. Um cinza azulado. E há gente morta ali.
Quem é, você me pergunta.
Tenho medo de descobrir. Tenho medo de continuar escrevendo.
Mas ainda tenho que me aproximar daquele abismo, o qual evito toda noite. Há
gente morta – ou estarão apenas dormindo? Parece como escombros de uma guerra.
Talvez essa seja a cena final desta maldita história. Um suicídio que não deu
certo. Ou deu e levou mais gente junto.
Quanto mais escrevo menos faço sentido. Ou talvez faça, e
isso me assusta.
Mas quero pensar mais um pouco nessas crianças. Talvez a dor
já tivesse sido marcada como destino para elas. Para Clara certamente foi. Mas
hoje quero pensar que elas podiam ser apenas crianças. É minha história, porra,
por que não consigo escrever? Crianças felizes, crianças brincando. Crianças
mudando o futuro. Jonas, Clara e Marcos. Marcos era o primo preferido de Clara.
Talvez fosse o de Jonas também. Eles podiam brincar em poças d’água, pensei
agora.
Será que é isso que significa a chuva?
Quem sabe esta história não termine com crianças brincando na
chuva?
Um sonho de crianças que nunca vão crescer, nunca vão parar
de brincar.
Esse podia ser o meu presente a vocês pelo seu dia.
23:21
Gostei da frase:..."no meio da dor ainda há esperança."
ResponderExcluirObrigado, Gisele. Hoje de noite tem capítulo novo.
ExcluirSeja bem-vinda ao quarto de Maria.