9
de janeiro de 2015
23:32
Encontrei
Sabatha no refeitório hoje. Ela estava comendo algo que parecia um bolo e
perguntou se eu queria. Eu disse que sim, e ela disse, corte um pedaço, que eu
não vou cortar para você. Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ou pensar
sobre aquilo, ela acrescentou: a garota dos brownies que me deu.
Comi
um pedaço.
Ainda
tinha gosto de infância.
Naquele
momento estava chovendo. Conversei com Sabby mais uma ou duas coisas, levantei
e disse que ia me retirar. Ela sorriu.
−
Eu sabia que você ia escrever hoje.
Parei.
−
Como você sabe?
Ela
manteve o sorriso, confirmando.
−
Eu sabia, disse ela. Talvez eu passe lá mais tarde.
Tudo
bem, disse eu. Vou escrever hoje, eu que faz alguns dias que não escrevo. Não
que alguém fosse sentir falta.
Você
sentiria?
Confesso
que andei fazendo o que disse que nunca ia fazer: li alguns trechos do que
escrevi nos últimos meses. E lembro que me dirigia muito a você. Ainda não sei
quem você é, ou se ainda está aí, ou vai estar quando eu terminar, como achei
no início. Mas me arrepiei ao perceber que, sem saber, já sabia. Intuí algumas
coisas que vim a descobrir meses depois. Não que saiba muito da história que
tento contar. Um desses malucos me perguntou hoje se penso no que vou escrever,
se tenho um esboço.
Não
sei nada. As palavras apenas aparecem, e ainda não sei de onde elas vêm.
Sarah
acha que é do inconsciente.
Se
for, talvez eu esteja mais dentro da história que estou contando do que quero
supor. O que não sei é o quanto. Quem sou eu que conta a história da pequena
Clara, filha de Maria. A mãe. Quem sou eu no meio do Dr. Claudius que voltou a
beber, que talvez tenha levado Clara em algum boteco. Isso tem sentido. Em vez
de levar a filha no parquinho, ele levou em algum pulgueiro. Talvez ela tenha
aprendido a brincar no meio dos garrafões de vinho, as malditas cebolas em
conserva, talvez houvesse dois homens jogando dominó. Cheiro de cigarro. Fogo
Paulista. Amendoim. Que mais eles comiam? Não sei, vou escrevendo o que me vem
à mente.
Talvez
o nome do bar fosse Decrépito’s.
Clara
correndo pelo Decrépito’s World, ela que deveria ter sido levada para a Disney,
mas Claudius estava se engraçando com Lara na noite de réveillon. E alterou o
destino de Clara. Ou seria esse mesmo o destino de Clara, virar namoradinha do
papai?
Meu
deus, que história de merda.
Como
odeio esta história.
Se
ainda conseguisse ver um sentido nisso. Na dor que houve.
Talvez
tenha havido. Não sei realmente o que fazer, eu, péssima escritora, e neste
momento quase me arrependo de dizer para Sabatha que ia escrever hoje. Estava
chovendo, mas não chove mais. Eu deveria escrever apenas enquanto chove.
Porque
existe algo com a chuva. Talvez esta história termine em um dia assim, mas
talvez a chuva limpe tudo. E nem todos morram, como suponho e neste momento me
aterroriza pensar nisso. Coisa que já pensei: estou escrevendo uma história que
já se passou. Achei que era apenas uma história boba, e que nem história era.
As pessoas foram surgindo: o homem alto e moreno, a mulher, a criança. A outra
mulher. A outra, do papai. Maldita Lara. Não sei mais o que escrever, mas não
consigo parar. Os pensamentos vão fugindo da minha cabeça, igual foi no começo.
Esta história é boba, mas não é inocente.
Não
é apenas uma invenção da minha cabeça. Ó, meu deus. Não é apenas uma história.
Ela
aconteceu mesmo.
Me
arrepio e entonteço.
A
história que estou inventando realmente aconteceu.
23:54
Minha nossa! E com quem aconteceu? Por que você só vai escrever quando chover? O que tem de tão especial na chuva?
ResponderExcluirPassarei aqui outro dia para ver as respostas!
Com carinho, Sabby
Essas perguntas pretendo responder em breve. Ainda não sei, mas sei que escreverei até, inevitavelmente, descobrir. Aliás, acho que vou para o quarto escrever agora.
ExcluirAté daqui a pouco, Mary.