5
de novembro de 2015
21:46
Não
está chovendo.
Mas
chove dentro de mim.
Tenho
vontade de chorar.
Preciso
continuar escrevendo.
Dessa
vez não foi o chamado da pequena Clara que me fez voltar.
Foi
Cris.
Doce
Cris.
Ela
tentou voar pelos muros. Voar para o infinito. Linda, eterna. Meu deus, mal
consigo escrever, as palavras me doem uma a uma, e a coisa está voltando. Ela
caminhou por cima dos muros, os muros altos, tão pertos do céu, tão perto de
qualquer lugar que não seja esse fim de mundo. Ela queria cair?
O
que você acha?
Cris
que quis ir embora antes da hora.
De
novo.
Minha
linda Cris.
Ela
quis voar sobre os muros.
Penso
em uma melodia linda, feito um corte no pulso, feito asfixia, feito remédios e
misturas, triste e linda, para ser tocada em um corredor escuro de paredes
cinza ou paredes sem luz, um corredor estreito de paredes altas com a pintura
descascando, uma caverna como alguns lugares deste fim de mundo – e a música
continua. Cris continua sobre os muros, mas então ela volta de lá. E vai para
outro lugar, onde não podemos nos ver, ou podemos nos ver menos, e tenho
vontade de escrever uma carta para ela, e talvez isso que esteja fazendo agora seja
uma carta, uma carta que talvez jamais seja lida, como tudo mais que escrevo
aqui, perdida dentro de mim. Então me voltou hoje o medo de enlouquecer. O medo
de que as vozes não se calem mais.
As
vozes voltaram.
E
não posso ver Cris, não agora.
Ela
está em outro lugar deste asilo, um especial para pessoas que querem voar pelos
muros. Que tentam voar, que conseguem voar, e que saem talvez no fim de tudo.
Mas
e se o fim não for o fim?
Então
paramos de querer voar pelos muros.
E
buscamos um sentido para aqueles que ficam. E para os que ainda não se foram.
Cris
está bem agora, me disse Sarah, que também me disse para falar sobre essas
vozes insistentes, vozes dissonantes feito um acorde de piano, e hoje não ouço
o piano. Apenas a melodia para ser tocada no corredor de paredes negras. Negras
e altas, como gigantes neste castelo mal-assombrado.
Estou
parecendo tétrica?
Foda-se.
Este
é o dia de hoje, aqui no Hotel Hospício.
Amanhã
será outro dia, prometeu Scarlett, e não sei mais o que escrever. Mas Sarah
disse para falar sobre as vozes com um médico porque há remédios que fazem elas
ficarem mais quietas, mais comportadinhas. Putas mal-criadas.
Sei
lá por quê, mas lembrei de Lara hoje. Lembrei do primeiro gole que Claudius
tomou quando estava com a titia putinha, titia que devia cuidar da sobrinha
Clara enquanto Mamãe Maria estava internada em um hospital.
Talvez
em um lugar de fantasmas como este onde me encontro.
Dez
anos. E ele foi mamar veneno na queridinha. Vou escrever o que me vem a mente
neste momento: talvez Claudius tenha levado a pequena Clara em algumas daquelas
reuniões, talvez ele tenha parado de ir nas reuniões, talvez ele tenha levado ela
em um boteco chamado Decrépito’s quando ela era criança.
Talvez,
não sei.
Vou
apenas tentando registrar as vozes, em tempo real, e vou escrevendo e o monstro
vai se acalmando. Se escrever esta maldita história é o que vai me afastar da
loucura, embora suspeite que também estou enlouquecendo por causa desta queda
livre dentro do abismo de dentro de mim a cada vez que escrevo, então devo
continuar. De qualquer forma, estou de volta. Aos meus escritos de escritora
amadora que jamais serão lidos. Mas se eles servirem para não voarmos pelos
muros hoje, então terei cumprido a minha missão.
Hoje
não.
E
se for isso que chamam de esperança, de novo: no fim talvez a gente encontre um
sentido em tudo e possa seguir até sair do outro lado. Sem voar pelos muros.
Caminhando, não como Garotas Com Fendas, mas como Princesas em um Caminho de
Tijolos de Ouro, de volta para casa.
De
volta para casa.
Me
arrepio uma vez mais.
Sim,
garotas lindas: um dia sei que voltaremos para casa.
22:10
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