8 de setembro de 2014
22:24
Eu não sei o quanto o acidente, ou seja lá o que foi que
aconteceu e que me trouxe a este lugar, fez com a minha cabeça, mas sei que as
coisas não andam bem. Além de não lembrar, tenho dificuldade em ler, me
concentrar nas coisas. Tem uns textos de Sarah sobre amnésia, trauma, descarga
emocional, catarse, ab-reacão e uma série de palavras que não entendo. Pelo
que, aos poucos, vou decifrando dessa salada toda: acontece um trauma. Que pode
ser real ou imaginado, ou os dois. Sentido, de alguma forma, e não pode ser
suportado pela consciência. Por isso, a gente esquece.
Ou recalca, se for criança.
Tenho certeza que Sarah está me largando pistas para eu
farejar, mas às vezes sinto como se fosse o coelho correndo atrás de uma cenoura
pendurada sempre um metro à frente do seu rosto, impossível de alcançar. Não
pode ser paranoia desta mente confusa. Eu podia estar lendo, tentando estudar
essas coisas intraduzíveis da psicanálise. Estudar é modo de dizer. Na verdade,
eu só preciso escrever e confiar que “algo” vai acontecer. De alguma forma, as
frases que jamais me programo para escrever vão se juntando de uma forma que
ainda não entendo.
Que bom que ninguém vai ler esta merda.
Nunca releio e morreria de vergonha se o fizesse. Maria
Envergonhada. Maria Com Nojo.
Maria Com Raiva.
Maria, ó meu deus, Com Medo.
Cada dia que fico sem escrever, a história de Clara vai para
algum canto inóspito do meu cérebro. Preciso escrever para me livrar. Essa
história não vai me deixar em paz enquanto não terminar de escrever. Essa
historinha sem graça. Que deve ter terminado, ou vai terminar, porque nem o tempo
da narrativa consigo organizar – eu, péssima escritora – em um acidente.
Um incêndio.
Todos morrem.
Acho que é assim que termina.
Alguém que era para morrer, morre.
Mas alguém que não era para morrer, morre também.
Isso sim geraria um trauma.
Isso sim faria alguém esquecer.
Uma tentativa de suicídio, pensei agora.
Alguém que não deveria morrer, morreu.
Ou vai morrer.
Meu deus, quanto mais tento fugir da teia, mais ela impregna
tudo o que faço. O abismo se aproxima.
Talvez eles não morram. Talvez Clara viva. Talvez Maria.
A mãe.
Estas garotas, que nem sei se são ou foram ou virão a ser,
garotas. Em minha mente e coração doídos, elas são belas. Talvez em sua dor. Há
uma flor em meio ao sofrimento. Um sentido para a dor que deve partir.
Suspiro.
Falei com Cris hoje. Ela está melhor. Jade está solteira. Vi
Brownie também. Saudades do cheiro de infância. O tal Aristóteles nunca mais
deu notícias – terá ele ido embora para nunca mais voltar? Dafne disse que
queria pintar um quadro disso tudo. O que será que ela pintaria hoje? Como
pintar as melodias que o piano e sua dança fazem em minha mente?
Pensei agora que Maria podia ter dançado com a pequena
Clara. Uma valsa. Uma canção de ninar. Uma melodia triste, mas linda. Ou linda
justamente porque triste. Maria dançando com sua filha Clara. Me arrepio toda e
sinto vontade de chorar quando escrevo isso. Meu deus, Maria dançando com
Clara.
Lindas.
Feito um solo de piano.
Encontrei sua pintura, querida Dafne.
22:42
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