Sábado,
8 de novembro de 2014
23:52
Você
me pergunta de onde tiro esta história, as palavras e personagens que povoam
meu texto a cada noite. A melhor e mais honesta resposta é: não sei. Acho que
não escolhi escrever esta história. Ela que me escolheu. Nunca, desde a
primeira frase que escrevi aqui, mais de um ano atrás, me programei para
escrever. Jamais soube o que ia escrever antes de escrever de fato. Apenas comecei
a juntar palavras e as coisas foram surgindo. Tudo nesta história foi feito
assim. Sarah chama isso de livre associação. Talvez você pense que tudo isso é
uma projeção de minha mente. Clara, Maria. Todos eles. Claudius, Lara, Jonas,
Marcos. Tudo isso é coisa da minha cabeça, basicamente. Tipo alter egos.
Meu
deus, as loucuras de Sarah e daquele velho tarado estão mesmo me contaminando.
Eu
não sei por que escrevo o que escrevo – ou sei e finjo que não sei, como talvez
dissesse Sarah, ou talvez não dissesse, porque psicanalistas não dizem o que
eles veem: esperam a gente ter nosso insight. E enquanto isso, amargamos
esperando. Mas talvez amarguemos por algum motivo. Tudo tem um motivo, dizem
eles.
Então
talvez sejam símbolos – sim, vou entrar na loucura mais um pouco – e cada uma
dessas pessoas tenha significados outros. O piano com certeza tem. Mas não ouço
ele agora e confesso que tudo aqui está silencioso e no silêncio me perco. O
piano me organiza, mesmo que ainda tenha dúvidas se ele existe.
Ele
existe, sim.
Paro
um pouco de escrever.
Fecho
meus olhos.
E
escuto.
Meu
deus. Como é lindo. Como é triste. E como a vida pulsa naquelas teclas. A
beleza nasce da dor. A cor que tento encontrar noite após noite, madrugadas sem
fim. A cor que não pode ser descrita, diria Dafne. Só sentida. Maria, a mãe,
tocando para sua bonequinha linda. Maria, que era espancada por Claudius. Maria
que vivia em hospitais. Maria como eu.
De
novo, tenho vontade de chorar.
O
piano que me rasga.
Que
me conforta.
Cada
dia que escrevo, que sinto em algum lugar perdido dentro de mim, que o piano
segue sua melodia, suas teclas, seus acordes, chorando, sorrindo, celebrando,
vivendo: é um dia a mais de vida para todas nós.
O
piano, em minha mente de péssima escritora, não está na mesma sala, sobre o
tapete claro. Está calor. Penso que o piano está ao lado de um riacho. Tem uma
cachoeira nas costas de Maria e Clara brinca na água. Não me diga que isso é
impossível: é minha história, escrevo do jeito que eu quiser. O piano está ao
lado de um rio que corre. Será isso simbólico? Talvez o piano nunca mais esteja
lá. Mas está hoje. E está calor. Não chove. O piano é como um deus do rio. Sua
melodia faz o rio correr. Clara molha os pés na água que segue, como a vida que
deve seguir. Jonas está brincando no meio das árvores altas. Muito altas. Há um
balanço e Jonas está sobre ele. Na verdade é uma cadeira de borracha e há uma
corda gigante que liga uma árvore na outra. Jonas vem voando na cadeira, riscando
o ar entre as árvores. Ele balança seus pés suspenso no céu. Clara sorri. Diz
que quer ir também. Maria disse que vai levar ela. Maria não está tocando mais
o piano. Mas a melodia segue.
Claudius
não está por perto.
Claudius
talvez nunca tenha existido.
Nesta
pintura ele nunca existiu.
Nem
Lara.
Sem
papai nem titia que deixaram a pequena Clara morrer antes da hora.
Nesta
pintura, não há morte. Não há dor. Apenas uma família feliz.
Filinha,
mamãe. Maninho.
Talvez
um fim-de-semana. Uma sede campestre. Um fim-de-semana que poderia ter durado
uma vida inteira. E no dia de hoje, sei que ele durou. Tenho vontade de sair
daqui, correr para dizer para Dafne pintar este quadro. Perguntar se Sabby tem
uma nova poesia. De dor, que seja, qualquer poesia é uma poesia de amor. Lady
Brownie talvez fizesse um doce, e eu ia esperar ela vir com seu jeito
devagarzinho para que eu mostrasse minha novidade para ela. Jade não vi mais,
mas talvez ela viesse também, e talvez trouxesse seu namorado, se é que ela
ainda está namorando.
Seria
uma reunião de família.
Que
é tudo o quanto eu quero sonhar hoje.
Uma
família linda.
E feliz.
00:17
Mary, eu não esqueci de você. Penso em você todos os dias em que escrevo. Você é uma amiga importante. É família, pois também sou destroçada na minha. Tenho que construir a minha própria. Eu estou com você Mary. Falo isso porque sabemos que a sua história está se complicando...
ResponderExcluirCom carinho, Sabby
Somos todas destroçadas, Sabby. Por isso escrevemos. Para recontar a história que se perdeu. E seguir em frente, caso a gente não encontre essa história ou descubra que não sobrou tanto assim. Enquanto escrevermos, há esperança.
ExcluirDe qualquer forma, fico feliz de ser lembrada.
Com carinho, Mary
PS - Ah, por que você acha que minha história está se complicando?
Oi, Maria.
ResponderExcluirAcho que a história está se complicando porque tu estás numa fase morna na análise, pronta para dar um salto... ou voltar para trás.
Qualquer uma dessas opções te complica. O que vem depois...
Com meu apoio,
Sabby